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Rodrigo Foureaux e Luiz Paulo Spinola


Antes do advento da Lei n. 14.688/2023 havia controvérsia acerca da possibilidade de crime militar ter natureza hedionda.

Com o advento da Lei n. 13.491/2017 os crimes previstos como hediondos na Lei n. 8.072/90, se não houver correspondência no CPM, poderão ser considerados crimes militares hediondos, se praticados na forma do art. 9º, II ou III, do CPM. Caso o tipo penal se repita no CPM e na legislação penal comum, em razão do princípio da especialidade, aplica-se o CPM, o que afasta a hediondez do crime, já que na Lei de Crimes Hediondos não havia nenhum crime previsto no CPM.

Adriano Alves-Marreiros[1] entende que o crime militar do art. 290 do CPM tem natureza hedionda em razão do tráfico de drogas ser crime equiparado a hediondo e o art. 2º da Lei de Crimes Hediondos – Lei 8.072/1990 – não traz a tipificação legal, apenas menciona o crime de “tráfico de drogas”.[2] O Superior Tribunal militar indeferiu pedido de indulto natalino a ex-militar condenado pelo crime de tráfico de entorpecentes previsto no art. 290 do CPM por considerá-lo crime equiparado a hediondo.[3]

Jorge Augusto Caetano de Farias[4] defende a posição de que os crimes militares por extensão caso estejam previstos nos arts. 1º e 2º da Lei de Crimes Hediondos – Lei 8.072/1990 – não perdem a natureza hedionda pelo simples fato de também possuírem natureza militar. Renato Brasileiro de Lima[5] possui entendimento no mesmo sentido.

Fernando Galvão[6] defende, além da tese de que os crimes militares por extensão podem ter natureza hedionda, que a Lei n. 13.491/17 revogou os crimes previstos no CPM com a mesma previsão na lei penal comum, como por exemplo o crime de estupro, isto é, o crime de estupro do art. 213 do CP revogou o crime de estupro do art. 232 do CPM.

Eduardo Luiz Santos Cabette[7] ressalta que a partir da edição da Lei n. 13.491/2017 “será possível caracterizar um crime militar hediondo” e que a alteração do sistema de competência da Lei n. 13.491/2017 nada tem a ver com os ditames da Lei n. 8072/90, de modo que a conclusão pela aplicabilidade da lei de crimes hediondos na Justiça Militar não pode derivar apenas da correlação entre os diplomas. Para Cabette, “como a Lei nº 8072/90 não prevê crimes, mas apenas arrola as infrações que considera hediondos ou equiparados, não é possível concluir que a Lei 13.491/17, ao afirmar que são crimes militares também os previstos na ‘legislação penal’ em geral empreende uma alteração capaz de fazer, por si só, que a Lei dos Crimes hediondos adentre à Justiça Castrense”. Segundo ele, a aplicação da lei dos crimes hediondos na Justiça Militar somente se legitima quando um militar vier a ser processado, na Justiça Militar, por crime previsto como hediondo ou equiparado na Lei nº 8072/90, desde que previsto na legislação penal comum, não no correspondente tipo penal previsto no CPM. Defende que a despeito dos vícios e inconstitucionalidades da lei de crimes hediondos, ela observa o princípio da legalidade estrita ao catalogar em rol taxativo quais os crimes hediondos, bem como os equiparados, de forma clara e segura, indicando não apenas o “nomen iuris”, mas o dispositivo legal onde está previsto, donde se conclui que as referências existentes na lei são feitas aos crimes previstos no CP e nas legislações esparsas comuns e não no CPM.

Fábio Roque Araújo, Klaus Negri Costa e Nestor Távora discorrem que mesmo com a possibilidade dos crimes previstos na legislação penal comum como hediondos se tornarem crimes de natureza militar em razão da Lei n. 13.491/2017 não há a possibilidade de serem crimes hediondos em razão da ausência de previsão expressa na Lei de Crimes Hediondos.[8]

Dessa forma, temos o seguinte cenário na linha do tempo:

  1. Antes da Lei n. 13.491/2017: doutrinariamente considerava-se apenas o crime militar previsto no art. 290 do CPM (tráfico de drogas) como hediondo;
  2. Após a Lei n. 13.491/2017 e antes da Lei n. 14.688/2023: além do crime previsto no art. 290 do CPM, passou a considerar como crime militar hediondo aqueles previstos no rol da Lei n. 8.072/1990, desde que praticados em situação que caracterizasse crime militar por extensão/extravagante, na forma do art. 9º, II e III, do CPM, com a ressalva da posição de Fábio Roque Araújo, Klaus Negri Costa e Nestor Távora que entendem pela impossibilidade de crime militar hediondo mesmo com o advento da Lei n. 13.491/2017.
  3. Com o advento da Lei n. 14.688/2023: além dos crimes militares por extensão ou extravagantes que encontrem correspondência na Lei de Crimes Hediondos[9], são hediondos todos os crimes militares previstos no Código Penal Militar que apresentem identidade com os crimes relacionados na Lei n. 8.072/1990.


[1] ALVES-MARREIROS, Adriano; ROCHA RAMOS,

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