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Rodrigo Foureaux e Luiz Paulo Spinola


A discussão dos crimes militares em tempo de guerra em um primeiro momento pode parecer não ter sentido ou qualquer efeito prático em razão da tradição pacífica do estado brasileiro em não se envolver em conflitos armados (o último findado em 1945 com a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial) e conforme preceitua o art. 4º, VII, da CF/88, a República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelo princípio da solução pacífica dos conflitos.

De toda forma, é importante que o debate ocorra em tempos de paz, pois as discussões nesses momentos de paz não trazem a contaminação decorrente da alta carga estressante dos tempos de guerra e caso seja necessário implantar tais disposições nos tempos de conflitos bélicos já se terá o conhecimento prévio de como aplicar o direito em situação de beligerância.

O estudo e discussão das normas penais militares em tempo de guerra decorre da aplicação do brocardo em que foi dada a autoria a Sun Tzu “Na paz, preparar-se para a guerra; Na guerra, preparar-se para a paz.”

O legislador, felizmente, em que pese com atraso, igualou a crime hediondo os crimes previstos na parte especial do CPM que possuam correspondência na legislação penal comum e sejam previstos como hediondos pela Lei n. 8.072/90.

O legislador deveria ter incluído no rol de crimes hediondos os crimes militares em tempo de guerra, Livro II do CPM, que não encontram correspondência na parte especial do CPM em tempo de paz. Conforme apresentamos a análise de cada crime na parte especial previstos para o tempo de paz fizemos também um paralelo com os crimes previstos para o tempo de guerra para definição se é ou não crime hediondo.

Os crimes militares em tempo de guerra ocorrem em um contexto de maior fragilidade da segurança nacional e dos bem jurídicos tutelados. Portanto, é necessário haver um maior rigor na punição e no cumprimento da pena. Dessa forma, todos os crimes punidos com pena de morte deveriam ter natureza hedionda, pois no próprio preceito secundário há a possibilidade de apenamento a pena privativa de liberdade ou o Presidente da República pode comutar a pena de morte em pena privativa de liberdade (art. 57 do CPM, c/c art. 707, § 3º do CPPM). Isso porque o Presidente da República pode indultar o condenado ou comutar a pena por outra menos grave – hoje previsto no art. 84, XII, da CF -, como ocorreu na 2ª Guerra Mundial. A comunicação ao Presidente da República não tem por fim solicitar a sua autorização para executar a pena, mas somente possibilitar que indulte o condenado ou comute a pena. Nos termos do parágrafo único do art. 57 do CPM, fica permitida a execução imediata da pena de morte, isto é, sem necessidade de comunicar o Presidente da República, desde que ela seja imposta em zona de operações de guerra, quando o exigir o interesse da ordem e da disciplina militares.

Portanto, a não inclusão como crime hediondo de todos os crimes militares em tempo de guerra que são apenados com a morte e com possibilidade de comutação à pena privativa de liberdade representa um grande descompasso, pois não possuem paralelo nos crimes hediondos previstos na legislação penal comum, como o crime de traição (art. 355 do CPM), o que impossibilita o reconhecimento da hediondez.

  • Obrigatoriedade de comutação à pena privativa de liberdade de crime militar punido com a pena de morte quando for praticado no contexto de guerra declarada e a persecução penal for encerrada após o fim do estado de guerra.

Cícero Coimbra e Marcello Streifinger sustentam que para haver a aplicação da pena de morte é imprescindível a existência de uma guerra declarada. O conceito de tempo de guerra encontra-se no art. 15 do CPM e se inicia com a declaração, o reconhecimento ou com o decreto de mobilização que compreenda esse reconhecimento, que é feito pelo Presidente da República autorizado ou referendado pelo Congresso Nacional, conforme art. 84, XIX, da Constituição Federal.[1]

Imaginemos o seguinte caso:

Durante o estado de guerra o agente pratica o crime militar de saque (art. 406 do CPM). Entretanto, sua persecução penal só se iniciou quando havia cessado o estado de guerra.

Na visão dos referidos autores, nessa situação, não é possível a condenação à pena de morte visto que não há mais o estado de guerra e o mandamento constitucional previsto no art. 5º, XLVII, a, da CF/88 somente permite a execução da pena de morte em caso de guerra declarada. Logo, após o estado de guerra não é mais possível a execução da pena de morte.

Dessa maneira, considerando que não seria possível a execução da pena de morte obrigatoriamente seria comutada[2] em pena privativa de liberdade e essa deveria ter o tratamento

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