Rodrigo Foureaux e Luiz Paulo Spinola
A doutrina[1] apresenta três sistemas para classificar a infração penal como hedionda:
- Sistema legal: crime hediondo é aquele previsto taxativamente na lei como hediondo. É o sistema adotado no ordenamento pátrio, conforme a Lei 8.072/1990.
- Sistema judicial: Crime hediondo é aquele que o magistrado analisa o caso concreto e entende ser hediondo diante das peculiaridades e gravidade do caso.
- Sistema misto: trata-se de uma mescla entre o sistema legal e o judicial. O rol dos crimes hediondos previstos em lei, para esse sistema, é exemplificativo.
Com o advento da Lei n. 14.688/2023 o legislador no inciso VI, do parágrafo único, do art. 1º da Lei de Crimes Hediondos não listou o rol de crimes previstos na parte especial do Código Penal Militar que teriam natureza hedionda, mas apenas empregou o termo “que apresentem identidade com os crimes previstos no art. 1º desta Lei.”, o que resultou nas teorias restritivas e da equivalência para interpretar quais crimes da parte especial do Código Penal Militar possuem natureza de crime hediondo.
Dessa forma, pelo fato de o legislador não seguir o critério estrito da taxatividade para definição do crime militar de natureza hedionda, sem dúvida, haverá grande insegurança jurídica ao se definir quais crimes previstos no Código Penal Militar possuem natureza hedionda. O cenário ideal é que houvesse um rol exaustivo dos crimes militares hediondos previstos na Lei n. 8.072/90 e que esse rol fosse sempre atualizado ao se modificar os crimes previstos na legislação penal comum, mas considerando o constante esquecimento do legislador na atualização da legislação penal militar optou-se por somente criar o sistema identitário para que, automaticamente, os crimes militares hediondos, sempre que atualizado o rol de crimes hediondos de natureza comum, fosse atualizado. Na Câmara dos Deputados optou-se por relacionar exaustivamente os crimes previstos no Código Penal Militar que teriam natureza hedionda, mas no Senado Federal alterou essa previsão para prever apenas que seriam hediondos os crimes previstos no CPM “que apresentem identidade com os crimes previstos no art. 1º desta Lei”.
Fernando Pessôa da Silveira Mello[2] afirma que como caberá ao juiz analisar quais crimes militares apresentam ou não identidade com os crimes do rol na Lei de Crimes Hediondos para aqueles serem considerados hediondos, houve flexibilização do sistema da taxatividade para definir se o crime militar é ou não hediondo, o que gera insegurança jurídica.
O sistema adotado para a análise do crime militar não é o sistema judicial, pois neste a análise se o crime é hediondo ou não ocorre de acordo com a gravidade de cada caso e não de forma abstrata pela previsão do fato criminoso no rol da Lei de Crimes Hediondos. Portanto, não houve adoção também do sistema misto que trata da adoção simultânea do sistema legal e judicial.
O inciso VI, do parágrafo único, do art. 1º da Lei n. 8.072/1990 gera ao aplicador do direito castrense a análise se a capitulação do crime previsto na parte especial do Código Penal Militar encontra identidade com os crimes previstos no rol da Lei de Crimes Hediondos de maneira abstrata, o que não leva em consideração o caso concreto. Logo, o sistema adotado continua sendo o sistema legal, o que passamos a denominar, no caso do Código Penal Militar, de sistema legal identitário.
Diante desse cenário, a Lei n. 14.688/2023 adotou um novo sistema para classificar o crime como de natureza hedionda, o qual podemos denominar sistema identitário, que é uma espécie do gênero do sistema legal.
[1] JUNIOR, João Biffe; JUNIOR, Joaquim Leitão. Concursos públicos: terminologias e teorias inusitadas. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO. 2017. p.36.
HABIB, Gabriel. Leis Penais Especiais – Volume único. 12.ed. São Paulo: Juspodivm. 2022. p. 422-423.
LIMA, Renato de. Legislação Criminal Comentada – Volume Único. 8.ed. Salvador: Juspodivm. 2020. p. 324/325.
ARAÚJO, Fábio Roque; COSTA, Klaus Negri; TÁVORA, Nestor. Curso de Legislação Criminal Especial. 2.ed. São Paulo: Juspodivm. 2023. p. 578-579.
[2] MELLO, Fernando Pessôa da Silveira; BRASIL. Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União (ENAJUM). Curso de atualização em Direito Militar Lei 14.688/23 | 06 Dez 23. YouTube. 06. dez. 2023. Trecho do vídeo a partir de 39min40s e 5h55min14s. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=qQ6H579Iqpw>. Acesso em 06. dez. 2023.
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