Polícia e Futuro – Autor: Sérgio Henrique Soares Fernandes. Prefácio e Introdução
PREFÁCIO O Doutor Sérgio Fernandes, distinto autor da mais recente obra sobre estudos policiais, dirigiu-nos, com amizade, o honroso convite para for- mular um breve contributo, a ser incluído no seu livro Polícia e Futuro: Identidade orientada por Cenários e Desenvolvimento Organizacional, que agora dá à estampa e que representa o produto de uma investigação que foi desenvolvida enquanto requisito parcial para a obtenção do grau aca- démico de doutor em História, Estudos de Segurança e Defesa pelo presti- giado Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL). O desafio central desta obra densa não podia ser mais atual, oportuno e cientificamente relevante, i.e., conceber uma identidade para o de- senvolvimento organizacional da Polícia, a partir de cenários prospe- tivos, numa sociedade em rede, multicultural, líquida, polarizada e de risco global. Para esse efeito, o autor aborda o processo civilizacional e a emergência da Polícia moderna, os modelos de Polícia, maxime o paradigma brasileiro numa perspetiva comparada; os referenciais teóri- co-conceptuais sobre o desenvolvimento e a identidade organizacional, as tendências dos cenários e uma proposta prospetiva do constructo de uma identidade policial, assente em novos fundamentos axiológicos e numa arquitetura estratégica mais ajustada aos desafios complexos que se colocam no futuro (que é […]
1. Conhecendo os Sistemas Policiais
Iniciando a trajetória deste livro, o primeiro capítulo objetivar-se-á uma abordagem dos sistemas policiais, como parte integrante da organização do Estado, com enfoque no nascimento da Polícia moderna; na tipologia dos modelos policiais; em alguns dos modelos existentes no mundo, como na França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Alemanha, Áustria, África do Sul, Estados Unidos, Chile e Coreia do Sul; e no sistema policial brasileiro. 1.1 O NASCIMENTO DA POLÍCIA MODERNA Para o entendimento do que é a Polícia conhecida hoje, torna-se conveniente uma breve digressão histórica acerca de sua trajetória, cujo recorte será da antiguidade até a idade contemporânea[1]. Esse período se justifica porque, conforme Afonso (2018), a palavra polícia nasceu na antiguidade, mas com sentido bem diverso do atual, significando governo da cidade-estado. De igual forma, de acordo com Bittner (2003), a polícia que se conhece na atualidade foi criada na Inglaterra no segundo quarto do século XIX, portanto na idade contemporânea. Porém, há quem diga que as primeiras atividades de segurança pública como função de Estado, para fazer com que todos respeitassem as leis da cidade, tenham surgido na Grécia antiga, no século V a.C. (Monet, 2001, p. 32), assertiva corroborada por Silva (2013, p. 19), que […]
2. Abordando o desenvolvimento organizacional e a Polícia
O segundo passo desta obra, contido no presente capítulo, tem como finalidades: promover uma abordagem ao Desenvolvimento Organizacional (DO) sob o prisma da demonstração de um arcabouço de Teorias das Ciências da Administração e das Relações Internacionais; apresentar ambientes e mudanças – palavras consideradas pedras de toque do DO; e demonstrar a Polícia com seu ambiente externo, sobretudo em relação ao macroambiente, ao microambiente e ao ambiente hostil no qual atua e está inserida. 2.1 Abordagens Teóricas O ponto de partida para o entendimento do DO repousa em quatro premissas, nomeadamente: a organização como um sistema aberto, a existência da relação de dependência dela com o ambiente externo, o ambiente como dinâmico e incerto, e a constante necessidade de adaptação da organização nesse ambiente (Fernandes, 2018). Tais condicionantes podem ser sintetizadas no binômio ambientes e mudanças, os quais dão sustentação teórica para uma aproximação ao habitat das organizações. Para Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000, p. 211), “o ambiente apresenta-se à organização como um conjunto de forças gerais, é o agente central do processo de geração da estratégia. A organização que não responder a essas forças será eliminada”. Os mesmos autores ensinam que “a chave para a administração estratégica é sustentar […]
3. Entendendo a Identidade Organizacional (IO)
A terceira parte da pesquisa, constituída pelo presente capítulo, destinar-se-á a uma apresentação da Identidade Organizacional (IO), com foco na sua conceituação, na demonstração da conexão existente entre identidade e DO, assim como na apresentação de cada componente da identidade, nomeadamente o negócio, a missão, os valores, a visão e a arquitetura estratégica, tendo a PMMG como supedâneo exemplificativo. 3.1 A identidade organizacional No âmbito das ciências gerenciais, a IO pode ser conhecida por uma diversidade de termos, como teoria do negócio, intenção estratégica, foco estratégico, propósito, macro-objetivo, premissa estratégica, escopo e identidade corporativa, dentre outros (Fahey e Randall, 1999; Drucker, 1995; Tweed, 1998; Fernandes, 2017; Fischmann e Almeida, 1991; Vasconcelos Filho e Pagnoncelli, 2001). Já numa abordagem sociológica, a IO[1] é construída pela interação social entre os indivíduos, o grupo, as relações de trabalho e a organização (Machado e Kopittke, 2002). Apesar de o termo “identidade corporativa” ser amplamente utilizado para expressar a IO, sobretudo no âmbito empresarial, Machado e Kopittke (2002, p. 8) estabelecem uma diferença quando revelam que “a identidade corporativa utiliza-se de formas visuais e a identidade organizacional é formulada e expressa por meio da palavra, a primeira tem um foco na externalidade e nas percepções […]
4. Explorando as tendências dos cenários
O presente capítulo tem como objetivo apresentar as tendências dos cenários-base “Brasil 2035: cenários para o desenvolvimento” e “Cenários de Defesa 2020-2039”, ambos construídos nos âmbitos internacional e nacional, os quais foram complementados por outras fontes, pesquisas e estudos. 4.1 Entendendo os cenários-base As fontes-base a serem utilizadas como subsídios para a presente obra foram construídas para o horizonte temporal de médio e longo prazos e corroboradas ou complementadas por outros estudos (Vaz, 2020; United States, 2017; United States, 2020; Teixeira Júnior, 2020; Nunes, 2020; Gaspar, 2020; Keck, 2014; Clarke e Ricketts, 2017; Rato, 2020; Marcial et al., 2020; TRADOC, 2019; Harrison, 2020; Pires, 2020; Harari, 2018; Harari, 2020; Schwether, 2020; Corrêa, 2020; Vieira, Ouriques e Arend, 2020; Sibaldelli, Silva e Cintra, 2019; Saldiva e Veras, 2018; Cerqueira et al., 2013). Esses trabalhos forneceram tendências para a formulação do negócio, da missão, dos fundamentos axiológicos e da arquitetura estratégica para as polícias militares. Dessa forma, na concepção de Marcial et al. (2020, p. 41) entende-se por tendência os “eventos cuja perspectiva de direção e sentido é suficientemente consolidada e visível para admitir sua permanência no período de cenarização considerado. As tendências são um diferenciado sinalizador a iluminar alguns elementos prováveis […]
5. Construindo uma Identidade prospectiva
O presente capítulo tem por objetivo apresentar a proposição de uma nova identidade organizacional para as corporações policiais militares com base na análise interpretativa dos cenários construídos nos âmbitos internacional e nacional. 5.1 Considerações Gerais Este capítulo se destina, conforme objeto de análise da presente obra, a apresentar uma IO, para as polícias militares, que seja compatível com as mudanças do ambiente nacional e internacional provenientes de duas fontes-base devidamente complementadas por outros estudos: “Brasil 2035: cenários para o desenvolvimento” e “Cenários de Defesa 2020-2039”. O capítulo ainda possui o condão de oferecer resposta à questão central formulada a montante da presente obra, no sentido de construir uma identidade padrão para as polícias militares, com base na interpretação das tendências apresentadas nos cenários prospectivos das fontes já citadas. O que se propõe é o desenvolvimento e a modernização das corporações policiais, por meio de uma nova identidade, baseando-se em cenários prospectivos já construídos, metodológica e cientificamente, complementados por outros estudos. O quadro 5.1 sintetiza o caminho percorrido pelo autor para a construção de uma identidade orientada por cenários futuros: Quadro 5.1 Esquema ilustrativo dos procedimentos Domínios Segmentos/temáticas com horizonte temporal até 2035 Procedimentos Configuração de uma Identidade prospectiva (2035) MUNDO […]
Conclusão
Visando atingir ao que se preconizou, o autor apostou numa articulação da obra em cinco capítulos, dos quais os quatro primeiros tiveram o objetivo de oferecer subsídios para um entendimento de cada temática inerente à pergunta central, nomeadamente: polícia, Desenvolvimento Organizacional, identidade e futuro. O quinto capítulo se consubstanciou no âmago do que se propôs, ou seja: delinear uma Identidade Organizacional para as polícias militares orientada por cenários construídos para 2035. Dessa forma, para responder ao desafio de como conceber uma identidade viável para o Desenvolvimento Organizacional da polícia a partir dos cenários prospectivos construídos até 2035, procurou-se formatar os capítulos, os quais corresponderam a cada uma das aludidas temáticas, visando delinear uma identidade futura para a Polícia. O primeiro capítulo versou sobre os sistemas policiais no mundo numa perspectiva comparada com o sistema brasileiro, bem como suas nuances e características. No segundo capítulo foi apresentada uma teorização de Desenvolvimento Organizacional com ênfase nas suas pedras de toque – mudança e ambiente –, tendo a Polícia como referência. O terceiro capítulo se dedicou a desenvolver abordagens que se aproximassem da Identidade Organizacional por meio de definições e conceitos de seus elementos constitutivos: o negócio, a missão, os valores, a visão […]
Referências
Abell, F. D. (1991). Definição do negócio: ponto de partida do planejamento estratégico. São Paulo: Atlas. Ackoff, R. L. (1976). Planejamento empresarial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos. Adler, E. (1999). O Construtivismo no estudo das relações internacionais. Lua Nova, 47. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-64451999000200011. Acesso em: 16 out. 2021. Afonso, J. J. R. (2018). Polícia: etimologia e evolução do conceito. Revista Brasileira e Ciências Policiais, 09 (01), 213-260. Afonso, J. J. R. (2015). A privatização de funções de segurança pública interna: funções inalienáveis do estado de direito democrático e novo paradigma de descentralização do exercício de poderes de polícia. (Tese de Doutoramento em Direito) – Departamento de Direito, Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa. Albert, S., Whetten, D. (1985). Organizational Identity. In: Cummings, C. C., Staw, B. M. (Ed.) Research in organizational behavior, 7, 68-76. Greenwich, CT: JAI Press. Almeida, K. S. (1991, Julho/setembro). Uma visão crítica do sistema policial brasileiro. O Alferes, 09(30), 9-30. Almeida, M. I. R. (2001). Manual de planejamento estratégico. São Paulo: Atlas. Andrews, K. R. (1971). The Concept of Corporate Strategy. New York Dowjones: Irwin. Araújo, E. S. (2009). As reformas da previdência de FHC e Lula e o sistema brasileiro de proteção social. Revista […]
Apêndice
COMPREENDENDO AS TÉCNICAS E AS METODOLOGIAS DOS CENÁRIOS PROSPECTIVOS O presente apêndice foi concebido pelo autor visando a uma exposição dos cenários prospectivos, sob o prisma do histórico e dos conceitos; da tipologia e das técnicas; dos principais métodos; e do método sugerido para aplicação à Polícia, com a finalidade de aclarar toda uma base teórica, doutrinária e conceitual acerca da metodologia da construção de cenários prospectivos. 1. Breve histórico e conceitos Pesquisar o futuro compreende a abordagem de sistemas e da pesquisa operacional e se destina basicamente a facilitar o planejamento de longo prazo, apoiado por diagnósticos do passado e com suporte de modelos matemáticos, tratamento multidisciplinar do tema, uso sistemático de opinião especializada e aproximação analítica de sistemas para problemas (PFI, 2020). A necessidade de conhecer o futuro sempre foi uma aspiração humana, vinculada talvez ao seu instinto de sobrevivência, e terminologia dessa necessidade apresentou variações, ao longo do tempo, desde a predição, perpassando pela previsão, pela profecia, pela projeção até a prospecção (Moritz, Moritz e Pereira, 2012). No final nos anos de 1930, como crítica aos processos de decisão baseados no passado, surgiu a prospecção, uma abordagem diferente para a construção de cenários, formalizada pelo filósofo francês […]